O
transporte fluvial existe há séculos nos rios Paraguai e Paraná, na América
do Sul. Na última década, os cinco países que partilham esses rios -
Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai - propuseram o projeto da
Hidrovia Paraguai-Paraná, que prevê a realização, no leito destes rios, de
dragagens, remoção de rochas, retificação de curvas e outras obras de
engenharia pesada, bem como outras intervenções não estruturais. Tais obras
abrangeriam uma área de 3.442 quilômetros de sistema fluvial, formando um
canal de navegação mais profundo entre as cidades de Cáceres (Brasil) e Nueva
Palmira (Uruguai). A hidrovia permitiria o transporte de mercadorias como grãos,
minérios e combustíveis vinte e quatro horas por dia, durante o ano todo.
O objetivo seria expandir a navegação e impulsionar o desenvolvimento econômico
regional. Como estes países, exceto a Bolívia, estão incrementando seu comércio
através do Mercado de Livre Comércio do Sul (Mercosul), o projeto da Hidrovia
Paraguai-Paraná tem sido promovido como a "espinha-dorsal" da integração
econômica regional (painel de Especialistas, EDF e CEBRAC - 1997).
A região tem muitas características particulares e únicas, como as áreas úmidas
do Pantanal e Chaco. O Pantanal, delimitado pela bacia do Alto Paraguai e com
aproximadamente 140.000 quilômetros quadrados, é a maior área alagada do
continente americano. Localizado no centro-oeste brasileiro, o Pantanal alcança
partes dos estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, como também da Bolívia
e Paraguai. Rodeada por cadeias montanhosas e planaltos, a região tem um
curioso ciclo de águas. Entre os meses de outubro e abril, as chuvas enchem o
rio Paraguai e seus tributários, alagando 80% da planície pantaneira.
O
Pantanal abriga a maior concentração de fauna do Novo Mundo, sendo comparável
às áreas de maior densidade animal da África. A região é moradia para mais
de 650 espécies diferentes de pássaros, 1.100 espécies de borboletas, 262 espécies
de peixes e outros raros animais em perigo de extinção. Entre eles,
destacam-se a onça-pintada, o tamanduá-bandeira, a ariranha, o lobo-guará e
as araras azuis. Estas áreas úmidas, bem como as similares no Chaco paraguaio,
existem devido a uma dinâmica e complexa relação entre os rios e as áreas
inundáveis de planície. É o equilíbrio existente na região que mantém a
rica e exuberante fauna e flora local.
As
obras de dragagem e retificação feitas no leito e margens do rio Paraguai
interferirão na vazão do mesmo, o que poderá acarretar em diminuição da área
alagada e, consequente desaparecimento do habitat natural de milhares de
animais. (foto: cervo do Pantanal) A justificativa dada pelos governos dos cinco
países para a construção da hidrovia é a de que o projeto tiraria do
isolamento uma das últimas grandes fronteiras agrícolas do mundo, formada pelo
centro-oeste brasileiro, leste boliviano e norte do Paraguai, ao baratear o
frete. A produção de grãos da região chega aos portos e centros consumidores
a um custo de 70 a 90 dólares a tonelada, preço muito superior ao dos grãos
produzidos em outros estados brasileiros e no meio-oeste americano. Com a
hidrovia, o frete seria reduzido para 53 dólares a tonelada, quase metade do
preço atual.
Em verdade, o Brasil tem muito pouco a lucrar com o projeto, uma vez que a produção
de soja de Cáceres, único produto brasileiro de real interesse para a
hidrovia, é pequena, e boa parte dela já é transportada pelo rio no período
das cheias. Apesar de ser o menor beneficiado economicamente, o Brasil
enfrentaria um enorme prejuízo ambiental caso acontecesse um acidente com uma
barcaça transportando combustível, por exemplo, o que não é raro de
acontecer.
Existem vários outros projetos que estão em andamento e que fornecem
alternativas mais baratas de transporte para os produtos brasileiros, sem os
riscos ambientais que a Hidrovia Paraguai-Paraná apresenta. A utilização das
Hidrovias Madeira-Amazonas e Tocantins-Araguaia, em construção, escoaria a
produção de grãos para o porto de Belém, de onde seriam levados ao mercado
europeu à um custo mais baixo que se exportado pelos portos do sul. Existe
ainda a possibilidade da utilização das ferrovias Corumbá-Bauru (que acaba de
ser privatizada e será totalmente reformada) e a Ferronorte (em construção),
que ligam o centro-oeste aos portos de Paranaguá e Santos.
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